PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO X LEGÍTIMA DEFESA
A QUESTÃO É: QUEM MATA ALGUÉM COM ARMA DE FOGO ILEGAL , EM EVIDENTE SITUAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA, RESPONDE PELO CRIME DE PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO?
Na Lei 10826/03 ( Estatuto do desarmamento)
Porte ilegal de arma de fogo de uso permitido
Art. 14. Portar, deter,
adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que
gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou
munição, de uso permitido, sem
autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
No Código Penal:
Art. 23 - Não há crime quando
o agente pratica o fato:
I – (...)
II - em legítima defesa
Legítima defesa
Art. 25 - Entende-se
em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários,
repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem
Quem mata alguém ilicitamente com emprego de arma de
fogo ilegal, deve responder por dois delitos ( homicídio + porte ilegal
de arma) ou somente pelo crime de homicídio?
Doutrina e jurisprudência
concordam que existe um só crime: o mais grave. Aplica-se aqui o
princípio da consunção, onde o crime-meio ( porte ilegal de arma) fica
absorvido pelo crime-fim. É que para que o crime maior pudesse ser consumado ( homicídio) , imprescindível a
passagem forçada pelo crime-meio( porte ilegal de arma) .
Seguindo tal raciocínio, agora indaga-se: quem mata alguém LICITAMENTE
com arma de fogo ILEGAL, responde por algum crime?
Este caso também já foi
enfrentado tanto pela doutrina (ex: Guilherme Nucci) quanto pela
jurisprudência (ex: STF, HC 111488). Ora, se uma pessoa mata outra de forma
LÍCITA é porque agiu amparado sob alguma
das excludentes de ilicitude apostas no art 23 do Código Penal, dentre elas, por
exemplo, a legítima defesa. Então, não
há crime de homicídio. Mas, será que
subsiste o crime de porte ilegal de arma de fogo? ( aplica-se o princípio
da subsidiariedade?) Afinal, este é um
crime de perigo abstrato, ou seja, quem sai de casa com uma arma na cintura sem
autorização legal, já pratica crime. Mas
e se essa arma foi empregada justamente para a legítima defesa própria ou de
outrem? Na visão da doutrina e jurisprudência, não subsiste o crime, uma vez
que este era o meio necessário para repelir uma injusta agressão, além de que, se
o crime maior está fulminado pela legítima defesa, não pode subsistir o menor,
pois foi o meio encontrado para alcançar o fim.
Portanto, a arma será apreendida, mas não subsiste qualquer
crime ao caso postulado.
CONFIRA NA DOUTRINA:
legítima defesa e estado de necessidade: a ocorrência da utilização de
arma de fogo em legítima defesa ou estado de necessidade, ainda que configure
qualquer tipo penal da Lei 10.826/2003, afasta a possibilidade depuração do
agente:- Afinal, a situação maior — de licitude— para a proteção da
integridade física própria ou de
terceiro, envolve e absorve o delito de perigo, relativo à posse ou
porte de arma de fogo, acessório ou munição irregular;
Guilherme de Souza Nucci - Leis Penais e
Processuais Penais Comentadas - 5º Edição - Ano 2010
CONFIRA NA JURISPRUDÊNCIA:
Segunda-feira, 27 de abril de 2015
Ministro aplica princípio da consunção e anula
condenação imposta a lavrador mineiro
O ministro Luiz Fux concedeu, de ofício, ordem no
Habeas Corpus (HC) 111488 para anular a condenação por porte ilegal de arma de
fogo imposta ao lavrador F.M.S pela Justiça mineira. No dia 8 de fevereiro de
2007, na zona rural de Caputira (MG), F.M.S. conseguiu evitar o estupro de sua
sobrinha de 13 anos ao disparar três vezes contra o agressor. Não foi
denunciado por tentativa de homicídio nem por disparo de arma de fogo, em razão
da evidente situação de legítima defesa de terceiro, mas o Ministério Público
estadual o denunciou por porte ilegal de arma de fogo de uso permitido. O
lavrador foi condenado a um ano e seis meses de reclusão em regime aberto,
tendo a pena sido convertida em pena restritiva de direitos.
No STF, a Defensoria Pública da União pediu a
aplicação ao caso do princípio da consunção para afastar a condenação. A
consunção ocorre quando um crime é meio para a prática de outro delito. Com
isso, ele é absorvido pelo crime-fim, fazendo com que o agente responda apenas
por esta última infração penal. Ao conceder o habeas corpus de ofício, o
ministro Fux acolheu parecer do Ministério Público Federal (MPF) no sentido de
que não há dúvidas de que os delitos de porte ilegal e disparo de arma de fogo
se deram em um mesmo contexto fático, motivo pelo qual se faz necessário
reconhecer a absorção de uma conduta pela outra.
“De fato, está configurada a consunção quando a conduta imputada ao paciente (porte
ilegal de arma de fogo) constitui elemento necessário ao crime fim (disparo de
arma de fogo), quando praticados no mesmo contexto fático. Destarte, tendo sido
afastado o crime de disparo de arma de fogo, por faltar ilicitude à conduta,
uma vez que praticada em legítima defesa de terceiro, não subsiste o crime de
porte ilegal de arma de fogo no mesmo contexto fático, sob pena de condenação
por uma conduta típica, mas não ilícita”, afirmou o ministro Fux em sua
decisão. Segundo o relator, o habeas corpus não pode ser conhecido por ser
substitutivo de recurso ordinário, entretanto o ministro concedeu a ordem de
ofício.
Nenhum comentário:
Postar um comentário